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01 abril, 2010

A economia do Rodoanel [Istoé Dinheiro]

Nos últimos anos, poucas obras viárias no Brasil custaram tanto e causaram um impacto tão significativo em alguns setores econômicos quanto o Rodoanel de São Paulo, rodovia que une as estradas que chegam à maior cidade do País. Segundo um estudo do governo de São Paulo, de 2002, ano em que o primeiro trecho do Rodoanel foi inaugurado, até 2005, o Produto Interno Bruto dos municípios cortados pela rodovia aumentou 30%. É o triplo da média brasileira. Na semana que vem, uma nova etapa da obra deve ser inaugurada.
Trata-se do chamado trecho sul, uma ligação de 57 quilômetros entre as estradas que vêm do interior paulista e do litoral. O projeto consumiu R$ 4,86 bilhões (quase quatro vezes mais do que o trecho anterior) e exigiu um contingente de 41 mil trabalhadores. E tudo isso para quê? Para reduzir os engarrafamentos em São Paulo, um problema tão grave que já ameaça comprometer o próprio desenvolvimento da cidade.
Com o trecho sul do Rodoanel, a quantidade de caminhões na Avenida dos Bandeirantes e na Marginal Pinheiros, duas artérias por onde os veículos pesados são obrigados a passar para chegar ao porto de Santos, poderá diminuir em até 47%. Isso é ótimo para toda a cidade, mas os impactos positivos do Rodoanel transcendem a questão da fluidez do trânsito.
Para um grande número de empresas – e para as próprias localidades que serão cortadas pela nova rodovia –, a obra tem um valor estratégico. “Para empresas de praticamente todos os setores, o Rodoanel vai proporcionar muitos ganhos”, diz Mauro Arce, secretário de Transportes de São Paulo.
Um estudo realizado pela consultoria Qualilog confirma esse potencial. Há pelo menos três anos, os terrenos que ficam no entorno do trecho sul do Rodoanel tiveram uma valorização de 50%, índice comparável apenas ao desempenho dos melhores pontos em algumas capitais nordestinas, região do Brasil que passa por um boom imobiliário. Num desses locais, em São Bernardo do Campo, a Bracor, empresa de investimentos imobiliários, e a holding EcoRodovias, que controla o Sistema Anchieta-Imigrantes, investiram R$ 120 milhões na construção de um pátio logístico que servirá de ponto de apoio para os caminhões que vão descer a serra rumo ao porto de Santos.
Segundo Marcelino Rafart de Seras, presidente da EcoRodovias, o local, que fica às margens do novo Rodoanel, vai contribuir para um melhor escalonamento de caminhões que chegam ao porto de Santos. Graças ao trânsito caótico de São Paulo, que se torna ainda mais imprevisível em dias de chuva ou acidentes graves, as empresas nunca sabem o tempo que vão levar de uma determinada cidade até o porto de Santos. “Isso gera um caos dentro do porto, com caminhões esperando tempo demais para carregar ou descarregar mercadorias”, diz Renato Barco, diretor de planejamento da Companhia Docas do Estado de São Paulo.
Com o Rodoanel, o cálculo do tempo será mais racional. Associado a isso, o surgimento de um pátio logístico poucos quilômetros antes do porto deve fazer com que o sistema de chegada e saída de caminhões funcione melhor. Investimentos como o da Bracor e da EcoRodovias devem ser seguidos por uma série de novos projetos.
Segundo Cristiano Cecatto, da consultoria Qualilog, os quase 60 quilômetros de extensão do trecho sul vão estimular o surgimento de muitos centros de distribuição. Um deles está sendo erguido pela Colgate-Palmolive, também em São Bernardo do Campo, e que servirá de base para toda a distribuição de mercadorias na região Sudeste do Brasil.
Os prováveis ganhos que as empresas vão ter com o Rodoanel são comprovados pelos benefícios que o trecho oeste da rodovia já trouxe para diversas indústrias. A Perdigão, uma das maiores fabricantes de alimentos do País, transporta parte da produção de suas fábricas no Sul para um centro de distribuição que fica no bairro do Jaguaré, em São Paulo. Segundo estimativas da empresa, antes do trecho oeste do Rodoanel, os caminhões demoravam duas horas desde o momento que entravam na cidade até a chegada ao Jaguaré.
Com a inauguração do Rodoanel, esse tempo caiu para meia hora. O trecho sul deve reduzir de forma significativa o tempo que seus caminhões levam para sair do centro de distribuição em São Paulo até chegar ao porto de Santos, de onde os frangos produzidos pela companhia partem para ganhar o mundo.
Para as empresas, as vantagens não são traduzidas apenas na redução do custo do frete. Livres do trânsito infernal da maior cidade do País, elas conseguem planejar de forma mais precisa suas entregas. “Com isso, as companhias passam a ter um controle melhor de seus estoques e até podem rever o tamanho da frota”, diz Cecatto, da Qualilog. É exatamente isso o que está fazendo neste momento a Volkswagen, que prepara um estudo sobre toda a sua operação logística. A Volks vive uma situação curiosa. O novo Rodoanel passa em frente à unidade da empresa em São Bernardo do Campo. A obra, porém, não vai mudar o esquema de produção da fábrica local, que já está estrategicamente posicionada no início da Serra do Mar. O que muda é a operação nacional da empresa, que tem fábricas no Sul do País e no interior de São Paulo.
As empresas especializadas na área de transporte estão comemorando a inauguração do novo trecho do Rodoanel. Uma das cinco maiores transportadoras do Brasil, a Braspress, que entrega mercadorias em todos os Estados brasileiros, estima uma diminuição de 20% no tempo que um caminhão vai levar de qualquer cidade do interior de São Paulo até a Baixada Santista.
“A inauguração deste trecho do Rodoanel representa uma grande mudança em nosso negócio”, diz Urubatan Helou, presidente da Braspress. Em alguns casos, a lentidão do trânsito em São Paulo pode aumentar em até 30% os custos logísticos. Se o trecho sul de fato tornar mais ágil o fluxo de caminhões na Grande São Paulo, o próprio valor do frete tende a cair de forma expressiva. “O novo Rodoanel é positivo para todo o sistema de transporte rodoviário de cargas”, diz Roberto Rodrigues, presidente da TNT.
Especialistas também apostam na valorização de algumas vias de São Paulo que deixarão de ser ponto de passagem para as incômodas carretas. É o caso da Avenida dos Bandeirantes, caminho obrigatório para quem vai ao litoral paulista, e que nos últimos anos passou por um processo de degradação. Até um projeto antigo do prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, que previa a criação de duas faixas exclusivas para caminhões no lugar do canteiro central da Bandeirantes, foi descartado.
É inegável que o Rodoanel deverá ser explorado politicamente pelo governador José Serra, candidato do PSDB à Presidência. Para esta reportagem, muitas empresas não quiseram se pronunciar por temerem uma vinculação de sua imagem à política. Mas também é irrefutável o fato de que o Rodoanel abre novas – e promissoras – fronteiras de negócios.

Fonte: Revista Istoé Dinheiro n. 651; disponível em http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/17733_A+ECONOMIA+DO+RODOANEL ; acesso em 28/03/2010.

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